Matéria publicada em 27 de maio de 2025.
O projeto Jornada da Mata, iniciativa que une educação ambiental, agroecologia e sustentabilidade, está ganhando novos contornos em 2025. Desta vez, os jovens formados nas edições anteriores assumiram o papel de mobilizadores e germinadores, planejando, executando e dando e a atividades em diferentes territórios do Rio de Janeiro. Com ações que vão desde ciclos de estudos sobre saberes ancestrais até oficinas de agricultura urbana em favelas, o projeto busca fortalecer a autogestão e o protagonismo dos participantes.
Autogestão e novos desafios
Luna Pesce, educadora e gestora do projeto, explica que a turma de 2023 foi dividida em grupos responsáveis por cada “pilar” temático do Jornada da Mata. “Antes, eles estavam no lugar de alunos e monitores. Agora, estão como facilitadores, dando aulas e organizando ações”, afirma. Entre os mobilizadores está Müller Portella, responsável pelo eixo de espiritualidade e autocuidado, que promove o Ciclo de Estudos Saberes da Terra em parceria com o Projeto Habitacional Grupo Mãe Bernadete, no Centro do Rio e Casa do Propósito, na Gamboa.


“Estar neste espaço de luta pela moradia popular no centro do Rio de Janeiro também é uma forma de política, porque precisa ser ocupado, precisa ter ações acontecendo que fortaleçam o projeto habitacional e seus participantes. A gente está promovendo esse ciclo de estudos tanto para o público da casa, como também é aberto para quem quiser se inscrever”.
Luna Pesce – Jornada da Mata e Centro de Tradições Ylê Asè Egi Omim

Já Luan dos Santos, outro mobilizador do Territórios do Saber, integra um coletivo de agroecologia da UFRJ, comanda o Curso de Agricultura Urbana na Rocinha, que, assim como o ciclo de estudos, também é realizado mensalmente. “Luan já trabalhava dando aulas, então eu fico quietinha, ele resolve tudo sozinho”, brinca Luna. Por outro lado, alguns jovens ainda enfrentam inseguranças. “Já aconteceu de chegarem bem nervosos no primeiro dia dos cursos/ciclos. Aí eu falei: ‘Calma, vai dar tudo certo!’E no fim sempre dá certo, porque todos com certeza já estão muito preparados para realizar essas atividades”, relata.
Pilares em ação e adaptações
Outros eixos ainda estão ganhando força. Artesanato e outras economias ainda não têm mobilizadores fixos, mas permeiam as atividades. Luna explica que a Muda [moeda social] está sendo inserida aos poucos e estão buscando parcerias. Enquanto isso, os pilares de alimentação consciente; plantio orgânico; auto cuidado e espiritualidade; e comunicação e gestão estão a todo vapor.


Na Zona Oeste, em Campo Grande, está acontecendo o Curso de Plantio Organico, em parceria com a Casa Bosque, importante Centro Cultural da região. Assim como nos outros territórios o curso é aberto a toda comunidade. As aulas são ministradas pela Ligia Diniz e também irão contar com a participação de outros mobilizadores e convidados ao longo do ano. O pilar Movimento começa suas ações em Junho com um ciclo de estudos sobre consciência corporal “Corpo Natureza” no Ponto de Cultura Escritório da Mata, em Santa Teresa. Lá também acontecerá outro ciclo de estudos sobre Compostagem Comunitária, ambas as atividades serão conduzidas pela mobilizadora Nane Vieitas.
Germinadores e o trabalho com crianças
Os participantes formados na turma de 2024 atuam como “germinadores”, apoiando os mobilizadores.
“Atuo como germinadora no Jornadinha da Mata, no Pilar Alimentação – sou nutricionista, e meu foco foi voltado especialmente para a alimentação afro-brasileira, principalmente com as crianças. Neste ano, vejo que a Jornada está muito focada em fortalecer os vínculos com os territórios onde já atuamos. Isso é essencial para dar continuidade aos projetos iniciados em edições anteriores e para ampliar nosso impacto. A dinâmica deste ano também está fortalecendo os laços dentro da equipe. Antes, participávamos como alunos ou ouvintes; agora, estamos na gestão, estruturando projetos juntos e criando soluções. Isso tem sido ótimo para desenvolver novas habilidades. Na Jornada, temos muita autonomia para propor atividades e projetos. É importante porque cada um traz vivências e formações diferentes, e sinto que nossas ideias são verdadeiramente valorizadas. Para mim, a Jornada é um projeto que assumo com compromisso e responsabilidade – é uma prioridade na minha agenda. Adquiri muita experiência, conheci pessoas incríveis e aprendi bastante. Vejo um potencial enorme nesse projeto, com muitos desdobramentos possíveis, e fico muito feliz por fazer parte desse coletivo.”
Clarissa Gomes da Silveira – germinadora no jornadinha da mata
Outra novidade é a Jornadinha da Mata, braço infantil do Territórios do Saber, realizado em parceria com o projeto Plantando Sustentabilidade na Favela, que acontece na Rocinha com a condução das mobilizadoras Cláudia Lacerda e Natasha Sanches. A Jornadinha atua com turmas da Escola Paula Brito, ONGs Associação Padre Anchieta, Casa Jovem e Sexta Lúdica, levando atividades de educação ambiental e alimentação consciente para as crianças e jovens da comunidades. A Sexta Lúdica, por exemplo, é realizada às sextas-feiras na Garagem das Letras, uma biblioteca comunitária. Numa destas sextas foi proposta uma criação de personagens com folhas: “A gente pegou folhas de tudo que é jeito: grande, pequena, roxa, amarela, pintada. E eles criaram uma máscara com estas folhas”, conta Luna. Nesta brincadeira, explicam a parte botânica, para que serve a folha na planta, qual a sua função para as árvores e para nós. E depois partem para a brincadeira com a criação de personagens para as máscaras e contação de histórias.
Na Escola Paula Brito, as crianças confeccionaram placas para nomear e batizar as hortas, e fizeram uma grande experimentação com diversas frutas, das mais diferentes às comuns. Muitas das crianças nunca tinham experimentado algumas delas, mas provaram e gostaram! Luna se alegra em contar que “uma das mães disse que sua filha começou a comer abacate depois desta aula”.
“Fiquei muito feliz porque já tem uma mudança real ali. E na horta tem essa mesma pegada: eles colhem maxixe e comem direto da horta. As crianças estão bem envolvidas. Eles gostam muito de comer e temos trabalhado bastante a alimentação. Numa aula só de tubérculos, raízes e rizomas, a gente fez um doce de batata doce com açúcar mascavo e coco. E eles botaram a mão na massa”.
Luna Pesce – Jornada da Mata
Transversalidade e futuro
Para Luna, a divisão em pilares é mais uma organização mental do que uma separação rígida. “Tudo está em tudo, como na natureza, na educação. O desafio agora é potencializar o coletivo”, reflete.


“Meu nome é Luan, eu atuo na Rocinha, no pilar de plantio do Jornada da Mata.
luan farias – mobilizador do jornada da mata
Minha percepção sobre essa nova fase do Jornada é muito animadora. Participei da primeira turma, em 2022, quando entrei no projeto como aluno, exatamente na aula de plantio na Rocinha. Dois anos depois, ver essa iniciativa evoluindo de outra forma, comigo agora como mobilizador, é muito gratificante.
É importante perceber que o que estamos construindo vai além do aspecto educativo para pessoas de fora. Já existe uma interação mais sólida com a comunidade e com os mobilizadores locais, em uma perspectiva real de aprendizado e construção coletiva.
Além do trabalho que estou realizando — como ministrar um curso de agricultura urbana, que acontece todo terceiro sábado do mês —, o projeto como um todo se tornou um coletivo. A forma como nos organizamos e o cuidado que temos demonstram isso.
Estamos vivenciando esse processo agora, aprendendo enquanto caminhamos. Sempre acreditei no potencial das pessoas envolvidas no Jornada e sempre enxerguei a possibilidade de fazermos algo grandioso juntos. Por isso, é muito bom fazer parte desse grupo.“
Confira o Instagram da @jornadadamata